quarta-feira, 26 de março de 2008

Seguindo estrelas

"Não ligue pra essas caras tristes,
fingindo que a gente não existe"

Uma carta

Coração, Amor, Biluca...

Me pego pensando em ti no meio da tarde e paro tudo. Olho tuas fotos e o que vejo? Meu coração pulsando, abusado, o sangue fervendo nas veias, os olhos ternos, as pernas meio moles... Não estou enganado: é amor, coisa séria. Grande, forte e poderoso. Capaz de romper limites e mudar nossos próprios paradigmas (temos sido tudo nesses últimos dias, menos convencionais...).

Não tenho medo.

Te amo assim, sem vergonha nenhuma (e bem sem-vergonha às vezes...), sem justificativa, sem razão. Porque é para sentir, não é para pensar. Que sem graça as coisas que de repente precisam ser medidas com fitas métricas ou em pequenas quantidades. E só quero que me queiras assim, por nós dois, não por qualquer outro convencionalismo que a gente ainda tenha na cabeça.

Lembrei de um poema que gosto muito. Se quiseres ler, esta aí. Chama-se "Amar", e te amo...

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

Até mais, Amor.

segunda-feira, 17 de março de 2008

O banho

Sempre começo o banho pelo pescoço, da esquerda para direita. É só uma chuveirada, mas não queria estar aqui. O sabonete escorrega pelo corpo molhado, os cabelos do peito se enchem de espuma espessa. É de propósito, isso. Enxaguo. Depois, penso. A água não está fria, nem eu. Lembro do MSN ligado e da tua foto no canto do vídeo. Agora, às pernas.

- O que será que ela está fazendo? - pergunto a ninguém que me acompanha.

Na verdade, quero saber no que estás pensando enquanto tomo banho.

A mão ensaboa as costas ao mesmo tempo em que o pensamento viaja a endereços incertos. Imagino que estivesse comigo. Do peito, desço mais um pouco mas fecho os olhos.

- Se estivesse aqui...

O que faria se estivesse aqui? Teria te puxado para dentro desse box, dane-se a roupa. O sabonete cai, não junto. Agora, não. Estou te vendo na minha frente de cabelo solto, molhado, blusa molhada, a boca úmida. A mesma blusa vermelha... grudada no corpo. Os calores não se acomodam em parte alguma e sinto que começo a estourar.

Abro a blusa. Já não estás mais de roupa alguma. Toco a pele com a mão ou é a tua pele que me toca? O cheiro de erva-doce do sabonete me confunde. O teu cabelo entranha na minha barba mas nem ligo.

Aperto os olhos. O abraço é forte, duro, lento e sôfrego. Minha mão espalmada desenha tuas costas enquanto a boca percorre o pescoço de uma ponta à outra. É ali o beijo tímido e quente, excitante, que primeiro te deixa com os músculos trêmulos. As pernas se enroscam, tua boca sussurra incompreensibilidades e sinto.

Sinto, mas se abro os olhos não vejo nada.

A fantasia se desfaz no vapor da água. Foste embora? De um instante para outro, o barulho do chuveiro me acorda. O box vira algo enorme, descomunal, e só um sabonete caído no chão me lembra que ainda estou no banho. Ligo a água fria e espero que passe.

- pronto.

- está limpinho?

- e cheiroso.

Escrevo. E espero que passe.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Três de três

O que sentia, na verdade?

Desmanchou um a um os castelos de tranqüilidade e segurança de hábito para admitir, pela primeira vez em dez anos, que a paixão voltara a alojar-se em si. Relutou no começo, também é verdade, mas o que fora não tinha volta. E no meio dos entulhos em que se transformaram suas lembranças, sentiu um certo prazer enviezado em amar alguém na distância dos anos.

Seu amor não exigia a concretude do corpo - o que tacitamente lhe fora proibido. E a crueldade da inexistência se mostrou a ele com o brilho relevante dos amores que acontecem nos planos mais altos da consciência, ou no espírito e não nas ruas, não soube dizer de certeza. Tinha o desejo de viver aquilo de novo, de sentir-se vivo e jovem de novo. Não, não pediria a ela que se entregasse, nem que ao menos o compreendesse. Queria somente o direito permitido de amá-la com a intensidade dos justos e a alma petrificada como um vaso de flor.

Dois de três

Disse palavra, mas o que ganhou o vento foi um sussurro. Belas e tristes palavras que soam até hoje como um lamento, recordou.

- Adoraria um beijo, não te escondo. Mas faz tanto tempo... Pensei que fosse impossível, que não combinávamos, que éramos tão comuns que só mesmo a amizade floresceria na pantanosa e infértil distância que nos afasta... - disse para ninguém em particular.

Um de três

Acendeu a luz e, de repente, o dia artificial invadira a noite de seu quarto de solteiro. Era a insônia que o visitava de novo, sem licença ou permissão. Os olhos purgavam a inconveniência das horas enquanto a mente mantinha-se em dez mil giros por segundo. Estava acostumado.

Não lavou o rosto, mas viu-se diante do espelho como um completo e inútil desconhecido. Passara horas em volta de um pensamento escorregadio e insistente sobre uma mulher de boca suculenta e espessa, encarnada ou feita de sangue, que roubara de sua vida o sossêgo adormecedor ao contar confissões condecendentes ao paladar amoroso do seu passado coração.

quarta-feira, 12 de março de 2008

A.

- Me conta?
- O quê?
- Sobre eles. Ficam juntos no final?
- Claro.
- ...
- Tudo sempre termina bem no final.

Para a menina mais bonita, R.

Olho a cidade ao redor
E nada me interessa
Eu finjo ter calma
A solidão me apressa
Tantos caminhos sem fim
De onde você não vem
Meu coração na curva
Batendo a mais de cem

Eu vou sair nessas horas de confusão
Gritando seu nome entre os carros que vêm e vão
Quem sabe então assim
Você repara em mim

Corro de te esperar
De nunca te esquecer
As estrelas me encontram
Antes de anoitecer

Olho a cidade ao redor
Eu nunca volto atrás
Já não escondo a pressa
Já me escondi demais

Eu vou contar pra todo mundo
Eu vou pichar sua rua
Vou bater na sua porta de noite
Completamente nua
Quem sabe então assim
Você repara em mim

terça-feira, 11 de março de 2008

Belas e tristes histórias

- Deveria haver uma razão justa para que as coisas sejam assim: o céu cinza por dentro de nós, os ídolos que afundam em mares inexistentes, o meu amor que não te toca.

D.

- Sempre lembro de ti.
- Lembra nada...
- Sério.
- ...
- Gosto de te ouvir, não sei.
- Não é isso.
- O que é, então?
- Todas as vezes que percebo que te amo, questiono. Acho que não mereço essa ausência de ti. A sensação que vem depois é quase como se tivesse pena do nada que sou. A dor legítima que sinto, então, é tão real quanto essas canções populares. De repente, tu és para mim um inabalável amor que não acontece.
- Explica
- Desses que não passam, amores que não acontecem.
- Eu não...
- De repente, quanto de vejo, ele se espalha de novo. Fogo em palha, água em pedra.
- ...
- Mas jamais vou te dizer isso de novo.

sexta-feira, 7 de março de 2008

Uma história em comum

A última vez que se viram foi há dez anos e, agora, os muros da escola já não eram distâncias.
- Adriana!
- Oi, Beto.
O ano era 1997. Estudavam juntos. Adriana, repetente. Roberto, tímido. A paixão dele, no entanto, fulminante como lançamento de uma adaga. Conversavam todos os dias. Gostavam dos mesmos assuntos. Combinavam até na altura. Só havia uma diferença abissal entre eles: Adriana era dois anos mais velha que Roberto.
Fossem eles maduros, tudo bem. Mas na oitava série, não dava. Roberto vivia seu drama só, sem entender porque o destino o amaldiçoara com um amor impossível por uma menina que já tinha a cabeça em outros lugares e horizontes.
O que nunca deixou de ser uma condição cruel.
Adriana gostava de Roberto. Não era amor o que sentia, definitivamente. Simpatizava com o jeito quieto dele, o modo como fazia as coisas e a inteligência prática que demonstrava.
- Tu vais ser jornalista - dizia ela.
Naquela época, era ligada em um menino do segundo grau que rivalizava em quietude com Roberto. Chamava-se Pedro. Além das boas notas, Pedro tinha um sorriso tão agradável e simpático que mais se parecia com um abraço.
Até que um dia derreteu-se por Adriana.
Roberto dispôs-se, no começo. Resignação era, afinal, o destino dos amores sem causa ou efeito.
- Sou amigo dos dois - disse algumas vezes para si mesmo, em voz alta, só.
Não duvide: aquela atitude de grandeza com o novo casal da escola traía o seu coração. Não demorou muito a perceber que deveria afastar-se, pobre Beto. Chegou a pensar, um dia, que se chorasse tanto quanto naquele tempo poderia desidratar-se em lágrimas soluçantes.
A vida, além de Pedro, afastou Adriana e Roberto. Ela virou escriturária do Tesouro Nacional. Ele, engenheiro elétrico. Ela, mãe. Ele, macambúzio. Agora, era dona Adriana. Ele, Beto.
- Sempre achei que tu seria jornalista.
- Tu vês...
Beto estava muitos anos a frente de Adriana quando se reencontraram e sua paixão juvenil ressurgiu não como chama, visto que era um homem sério e pouco afeito à veleidades. Assemelhava-se à nostalgia das lembranças incompletas ou não acontecidas e traziam à boca de Beto um gosto desconhecido e bom, quase confortante. E se tivessem dado certo?
- Agora, sou mãe. Casei. E tu?
- Eu? Não casei. Não é para mim.
- Não quiseste ter família, Beto?
A pergunta o pegou de surpresa. Sim, Beto quisera uma família com Adriana. Infantilmente, desejara filhos com ela, viagens de férias, uma casa confortável e até as brigas corriqueiras de um casal Beto imaginara, um dia, com Adriana.
- Não, não é para mim.
- Bom te ver.
Quando Adriana pronunciou aquelas palavras, Beto sentiu que a conversa chegava a um ponto intransponível. Desejou profundamente que tivesse coragem para contar a ela o que havia sentido. Pensou, por um segundo, que a distância do tempo poderia fazê-la compreender as intensidades juvenis e esquecidas daquilo tudo mas não deu. Beto era um tímido.
- Até a próxima, Beto.
- Até.
E partiram cada um na direção de um futuro ausente de encontros no grande desencontro que fora sua história em comum.

quarta-feira, 5 de março de 2008

28

- Ainda hoje vivo por ti um completo e profundo amor.
- Passa o cigarro e não fode.
- ?
- Quero dizer não fode a paciência...
- ??
- Tá, tá, desculpa. Não sei ser romântica.
- Eu só queria que olhasse nos meus olhos e soubesse da sinceridade dos meus sentimentos...
- Hei!
- O quê?
- Não fode mais.

I'm feel (not) good

"A falta de esperança e o tormento
De saber que nada é justo e pouco é certo
E que estamos destruindo o futuro
E que a maldade anda sempre aqui por perto."

The song remind the same

"Tudo o que você faz,
Um dia volta para você."

(...)

(Nada do que eu faço será suficiente. É tudo por ela. Acho uma injustiça o que dizes sobre mim. Embora entenda a irritação que sentes, não posso deixar que me ofenda a cada vez que tua cabeça enche.)

segunda-feira, 3 de março de 2008

Back

"Tentei concertar palavras", ela disse
Mas ficou muda.
Procurou sons em portas fechadas
Notas musicais em cativeiros decadentes
E virtuais.

Movimentou-se, pelo menos
Saúdo à sua volta
Com a alegria militante.

Numa camiseta

Just don't try this if you drive a truck.

Cada coisa ao seu tempo

Prepara as saída uma a uma, lado a lado
A plataforma reluzente brilha às intensidades
Enxerga as portas como chances de fuga.
Quase consegue ver atavés das paredes,
Basta que se eforce.

Hoje, será um super-herói.

Chega de ser coitado, pensa
E abre logo os seus próprios caminhos.
Respira fundo.

É como se seus olhos fossem forçados para fora das órbitas.
No instante seguinte há uma leveza diferente em seu corpo
Os sabores são outros
A barriga gela. Acende
Um cigarro e vai
Para rua.

Não

compassos a serem seguidos.
Passa o herói.
Passa o conforto.
Passam os pensamentos profundos.

A superficialidade lhe machuca
E um novo buraco se abre.

Quais portas abrirá hoje
Para ser de novo super-herói?